9° Registro - O Despertar dos Mortos - Parte 1 de 5


Ainda estou tremendo e acho que ainda não me recuperei do choque. Acho que estou entrando em pânico. Eu não sabia pra onde ir, o que fazer. Ao ver o notebook na cama eu o peguei e comecei a digitar sem parar. Preciso descarregar a adrenalina que ainda estou sentindo. Fico olhando pra todos os lados. Minhas mãos ainda tremem. Que pesadelo. Merda! Merda! Merda! Estou sonhando?

Creio que não... Infelizmente não...

Preciso relatar aqui o que acabei de presenciar. Meu Deus. Ainda não acredito nisso tudo. Não sei se alguém vai ler, mas vou escrever mesmo assim. Preciso disso. Preciso...

Abri meus olhos e vi que uma fraca luz brotava pela janela do meu quarto. “Mais uma vez dormir a noite inteira”, pensei comigo. Mas naquele momento o que mais havia me chamado atenção era que eu estava normal. A dor de cabeça, dor no corpo, tosse, febre e calafrios não existiam mais. Eu estava curado do que quer que eu tenha ficado doente. Me despreguicei e bati a mão no notebook que ainda estava na cama. Me levantei e rapidamente fui tomar um bom banho. Ai sair do banheiro eu ouvi um barulho que provavelmente estava vindo do apartamento de cima. Me troquei e fiz um rápido café. Passei o olho pelo meu quarto e vi o celular carregando. Ou ainda conectado, pois já havia carregado por completo. Quando peguei o celular, meu coração quase parou. Duzentas e quatro ligações não atendidas. Cento e dezoito só da minha namorada. As ligações restantes eram do meu irmão. Foi então que vi algo que me assustou completamente. Era dia 02 de agosto. 02 de agosto? Isso fez minha cabeça girar. Por quanto tempo eu dormi? Impossível. Dormir três dias diretos é impossível. Acordei limpo. O que quero dizer é que acordei algumas vezes pra ir ao banheiro, beber agua. Como não me lembro disso? Me sinto como se tivesse me deitado a noite e acordado na manhã do dia seguinte. Tentei ligar para minha namorada e para meu irmão, mas o celular estava sem sinal.

Tentei ligar o notebook, mas ele estava descarregado. Coloquei ele pra carregar quando ouvi outro barulho. Dessa vez no apartamento ao lado. O apartamento do senhor Francisco. Vesti uma camiseta e sai do meu apartamento. O hall do elevador estava vazio. Aqui são quatro apartamentos por andar. Então eu via duas portas na minha frente e a porta da apartamento do senhor Francisco ao meu lado direito. Era um hall pequeno, de uns doze metros quadrados. Duas portas de frente pra duas portas, um elevador do lado esquerdo e a porta das escadas do lado direito.

O hall estava todo escuro e a luz automática que sempre acendia quando detectava alguém não acendeu. Ameacei bater na porta do senhor Francisco quando percebi que a mesma estava semi aberta. Mesmo assim dei duas batidas leves e aguardei. Ninguém veio me atender ou respondeu de dentro. Ouvi um barulho vindo de dentro do apartamento e por alguns segundos cogitei retornar, mas o simples fato de terem se passado três dias me fez pensar que alguma coisa poderia estar errada. Meu coração disparou e tive um leve calafrio. Senti medo. Sem saber o porquê, eu senti medo. Abri a porta do apartamento e uma cena estranha me foi revelada.

O apartamento estava revirado. A mesa da sala estava caída e quebrada. O sofá estava fora de lugar. Mas o que me fez congelar e recuar foi ver manchas de sangue nas paredes. Sem dar um passo a mais eu peguei meu celular e liguei para a policia. Em vão. Nem se quer chamou. Pensei em voltar até que ouvi outro barulho vindo do corredor que levava para os quartos.

– Rodrigo? – chamei perguntando.

Ouvi outro barulho e em seguida barulho de passos. Alguém estava vindo ao meu encontro.

Meu Deus do céu. Começo a tremer só de lembrar. O que era aquilo? O que era aquilo?

Ouvi os passos se aproximando da sala. Eram lentos e arrastados. Quem quer que estivesse se aproximando estava emitindo sons estranhos, tipo gemidos de dor. Senti meu coração se apertar. Dei dois passos para trás e fiquei na entrada do apartamento.

Então ela apareceu...

Meu coração quase saltou pela boca. Minhas pernas tremeram e me senti fraco. Um calafrio percorreu minha espinha e minhas mãos tremeram. A senhora Fátima. Que havia morrido poucos dias atrás. Em pé. Caminhando em minha direção saindo do corredor dos dormitórios. Uma cena tirada do fundo do inferno. Usava uma camisola de seda que deveria ser rosa, ou coisa do tipo, mas naquela hora estava encardida de sangue seco. O corpo estava todo inchado e cheio de marca de veias estouradas. As mãos estavam sujas de sangue. E o rosto dela... Meu Deus... Nunca vou esquecer essa visão.

O rosto... O rosto estava todo inchado. A boca rasgada e cheia de sangue escorrendo pelo queixo e caindo pelo pescoço. As sobrancelhas inchadas e quase cobrindo os olhos brancos e cheios de pus misturado com sangue viscoso. O cabelo estava todo bagunçado. Um enorme corte na testa estava cheio de pus e sangrando.

Eu fique paralisado de medo. Aquela cena tão impressionante acabou prendendo minhas pernas no chão. Até aquele momento aquela senhora, ou o que quer que fosse ela, não havia percebido minha presença na entrada do apartamento. Ela continuou caminhando e pude ver uma faca de cozinha cravada nas suas costas, um pouco abaixo do ombro direito. Dei mais um passo pra trás e acabei esbarrando na porta. O barulho fez a velha olhar rapidamente pra mim. Um gemido desumano brotou de sua boca e ela abriu os braços em minha direção.

– Dona Fátima? – perguntei inocentemente.

Escrevendo isso chego a caçoar de mim mesmo. Como foi ridícula minha reação. Mas eu ainda não imaginava com o que estava lidando.

A velha continuou a caminhar em minha direção, até que ela tropeçou no sofá atravessado na sala e se espatifou no chão. Ela rolou pelo chão da sala e fez a faca que estava em suas costas rasgar ainda mais a sua pele.

Foi ai que percebi que o que estava na minha frente não era humano.

Minha mente processou as informações em segundos. Eu não ficaria ali parado observando aquela cena do inferno nem mais nenhum segundo. Foi então que ao me virar dei de cara com o senhor Francisco.

Porem ele estava longe de ser o senhor Francisco que eu conhecia...

Postado 02/08/2012 ás 17h12. Taubaté-SP

8° Registro - Medo


Alguém online? Por favor! Preciso falar com alguém? Misericórdia! Me respondam nos comentários, por favor! O que está acontecendo? O que é isso tudo? O que são essas “coisas” que me atacaram e que estão vagando por todo o prédio e por toda a rua lá embaixo? É o que eu estou pensando que é?

Amor, você que estava lendo meu blog ai da sua casa. Estou tentando te ligar, mas não estou conseguindo! Por favor, me responda! Preciso saber que você está bem. Eu vi suas ligações perdidas! Eu estou bem! Por favor, Deus!

Gustavo! Você também estava lendo o blog ai do quartel! Me responda irmão! Eu também vi suas ligações perdidas! Eu não sei o que aconteceu comigo! Mas eu estou bem agora! Gustavo?

Meu Deus... Estou ouvindo eles... São dezenas deles por todos os lados...

Eles estão aqui... Eles estão chegando...

Alguém me responda... Por favor...

Postado 02/08/2012 ás 13h46. Taubaté-SP

7º Registro - Princípio do caos - Parte 7 de 7


Estou sem forças pra fazer qualquer coisa. Passei a tarde inteira com minha namorada no telefone até que a linha caiu. Não sei o que aconteceu. Minha namorada estava em prantos com minha situação. Não sei o que está acontecendo. Tenho certeza que estou doente. Acho que contraí esse maldito vírus. Não sei como. Não tive contato com ninguém doente.

Hoje cogitei ligar para a emergência. Mas me lembrei do caos que está o hospital esses dias. Meu Deus. Que horror que estão sendo esses dias.

Tentei falar com meu irmão também, mas não consegui. Tomara que tudo esteja bem com ele.

Não tenho forças pra continuar pessoal. Preciso me deitar novamente. Hoje já dormir o dia inteiro. Deitei ontem por volta de meia-noite e só fui me levantar da cama por volta de três da tarde.

Não quero morrer. Por favor...

Postado 30/07/2012 ás 19h21. Taubaté-SP

6º Registro - Princípio do caos - Parte 6 de 7


Alguém sabe me explicar o que aconteceu? De verdade. Papo sério. Se nesse exato momento alguém lhe perguntasse o seguinte: “Como foi que tudo aconteceu?” Você saberia responder?

Eu mesmo não saberia responder. As poucas coisas que aqui relatei foram fatos que realmente me impressionaram e ficaram fixados na minha memória. Com certeza deixei importantes informações de lado. Apesar de que eu não me aprofundei no que realmente estava acontecendo. Somente ouvia e lia algumas noticias que achava importante. O fato é que em menos de um mês o mundo desabou e caiu num buraco profundo. Chega a ser surpreendente tudo o que aconteceu. Todos os meios de comunicação possíveis nos deixaram na mão. Internet? Nada. TV? Nada. Rádio? Nada. Isso é o que torna o ocorrido ainda mais assustador. Por quê? Por que não temos mais noticias? O que está acontecendo? Onde estão os governantes? Porque estamos trancafiados em nossas casas? Que vírus é esse que está extinguindo a humanidade? Porque será que acho que nunca teremos essas respostas?

Hoje quando acordei fiz o mesmo dos últimos dias. Levantei, tomei um banho, um café e fui para frente da TV. Peguei o notebook e fiquei ali, sentado e atento a qualquer possibilidade de uma nova noticia. Infelizmente nada aconteceu. Naveguei em todo quanto é site da internet. Nada. Naveguei por todo quanto é canal de TV. Nada. As principais emissoras encerraram suas transmissões. O torturante fundo colorido é a única coisa que temos há dias na TV. Nem plantões de hora em hora e nem noticias repetidas. Algumas emissoras ficam passando programação repetida. Perco o meu tempo lendo blogs e sites que falam do fim do mundo, invasão alienígena e coisas do tipo. Pelo amor de Deus gente. Isso é coisa séria. Pessoas estão morrendo.

Pra não dizer que não vi nada, ontem antes de ir dormir eu vi um vídeo na internet de um blog mexicano chamado “Teorias e conspirações”. No blog eles relatam que conseguiram filmar uma ação militar na pequena cidade de Cocula, onde foi encontrado o primeiro caso do vírus. O vídeo era horrível, pois a câmera era amadora e pra ajudar estava de noite, além de que o áudio estava em outra língua, claro. Aparentemente os militares foram avançando uma pequena rua e em certo ponto pararam bruscamente. O militar da frente, provavelmente o comandante, deu um sinal e toda a tropa ficou em posição de batalha, ou seja, com seus armamentos apontados para frente. Em menos de um minuto uma movimentação estranha foi vista do outro lado da rua e o comandante autorizou o liberar fogo. Foi uma cena surpreendente. O áudio chegou a irritar os ouvidos por causa dos constantes tiros de fuzis, pistolas e outras armas que eu desconheço. Totalmente tomado de medo o cinegrafista começou a gritar e tremer a câmera, e em seguida encerrou a filmagem. Alguns comentários no blog diziam que eram cenas reais, outros diziam que eram cenas tiradas de um filme amador. Mas realmente eram cenas surpreendentes. Depois disso mais nada. Hoje entrei no mesmo blog e não tem nenhuma noticia nova.

Hoje à tarde fiquei conversando com Rodrigo. Ficamos jogando sinuca no salão de jogos do condomínio. Ele ficou irritado por perder todas as partidas. Uma figura. Adora desenhar mangá e é fã de uma série “nerd” chamada “The Big Bang Theory”. Concordei com ele. Eu também assistia essa serie e ela é realmente engraçada.

Ele disse que a esposa do senhor Francisco parece estar piorando por causa do vírus. Que triste. Por diversas vezes ele parava o jogo para olhar pelo portão, imaginando como fugiria dali. Era nítido ver o desespero em seus olhos. Sua mãe estava doente em sua casa e ele estava com as mãos atadas. Por diversas vezes eu via ele com o olhar perdido. Parecia se culpar por estar dando risada e se divertindo enquanto sua mãe sofria longe dali. Eu sabia o que ele estava sentindo, pois eu sentia praticamente o mesmo em relação ao meu irmão e minha namorada. Infelizmente tento convencer ele que vai ser praticamente impossível sair do prédio, pois faz um dia inteiro que uma viatura estacionou na esquina e não sai dali de jeito nenhum. O que mais deixa ele angustiado é o fato de não conseguir nem falar com a mãe, já que provavelmente o celular dela tenha acabado a bateria e ela não o tenha colocado pra carregar, afinal estava sem forças até pra levantar da cama.

Continuaríamos jogando mais se eu não começasse a espirrar que nem louco e reclamar de dor no corpo. Rodrigo ficou assustado e resolveu ir para o apartamento. Não reclamei. Eu faria o mesmo. Agora estou largado no sofá. A dor no corpo aumentou e minha cabeça está explodindo. Os espirros também são constantes. Minha namorada começou a chorar quando contei o que estou sentindo. Demorei quase meia hora para convencer ela de que não precisava se preocupar. Meu irmão também me fez alguns relatos interessantes. Ele me disse que alguns militares também ficaram doentes e foram isolados do resto do batalhão. Disse que o exército está ajudando a policia no patrulhamento das ruas. A ordem realmente é deter qualquer um que for encontrado fora de casa. Meu irmão também ficou sabendo que o prefeito da cidade se retirou para uma fazenda em alguma cidade vizinha. Ou seja, estamos abandonados. Não há previsão para tudo isso acabar. Ele disse que os comandantes do exército da cidade mantem constante contato com os militares da capital. “A situação é caótica”. Essas foram as palavras do General daqui. Segundo o general eles estão mantendo as ultimas ordens. Auxiliar a policia militar a manter os moradores em suas residências e também auxiliar os paramédicos na locomoção de um paciente até um hospital. Nada mais. Nenhuma nova ordem foi dada. Pelo que meu irmão entendeu, eles (os comandantes) estão aguardando ordens de alguém que não deve nem estar mais vivo. Isso realmente é assustador.

No final da tarde ocorreu um acontecimento muito triste. A senhora Fátima, esposa do senhor Francisco, veio a falecer devido a ter contraído o vírus. Infelizmente era muito difícil uma pessoa de idade suportar os efeitos de um vírus tão poderoso e maléfico. Rodrigo veio me comunicar e disse que o senhor Francisco estava abalado. Fui prestar meus pêsames e vi, de longe, que a porta do quarto estava trancada e que todos estavam com medo de entrar no quarto, devido a possível contaminação pelo vírus. A senhora Fátima nunca foi uma pessoa de bom comportamento. Sempre implicava com as coisas do prédio e parecia que estava sempre de mal humor. Carrancuda e grosseira. Era assim que os condôminos a rotulavam. Porem naquele momento não teve como não sentir tristeza pela morte dela. Por mais complicado que era o relacionamento com ela, não era algo que ela merecia.

Voltei para meu apartamento com os olhos marejados de lagrimas. Porem eu não sabia se era pela tristeza pela morte da senhora, ou se era por causa dos estranhos sintomas que eu estava sentindo o dia inteiro.

Isso me deixou assustado. Estou com febre e a dor de cabeça é muito intensa, tenho frequentes calafrios, estou muito cansado, com tosse seca e contínua, muita dor no corpo e irritação nos olhos.

Preciso parar um pouco e tomar um bom banho quente e ir pra cama.

Boa noite.

Postado 29/07/2012 ás 23h18. Taubaté-SP

5º Registro - Princípio do caos - Parte 5 de 7


O dia 17/07/2012 (uma semana depois das vacinas serem liberadas no Brasil) amanheceu com uma bomba. A presidente do Brasil declarou ao vivo na TV que a lei marcial estava sendo decretada no país. A partir daquele momento quem mandava eram os militares. Um homem subiu ao palco. Tinha os cabelos brancos, um pouco magro, barba por fazer e cara de poucos amigos. Seu nome era Enzo Martins Peri. General comandante do Exército Brasileiro. Ele decretou em todo o país a “quarentena residencial”. Todo o cidadão do país deveria ficar em sua residência até segunda ordem. O exército e a policia ficariam encarregados de patrulharem as ruas e certificarem que todos estavam cumprindo essa “ordem”. Qualquer pessoa que fosse encontrada na rua seria levada para a delegacia e ali permaneceria até segunda ordem. Tudo até segunda ordem. Isso já estava dando nos nervos. Eu não tive tempo pra nada. Desci pro estacionamento, mas quando estava saindo na rua uma viatura bloqueou meu caminho e ordenou que eu retornasse. Hoje eu fico pensando que poderia ter mentido pra eles e falar que estava indo pra minha casa. Mas no momento eu não tive reação e voltei. Merda. Aquilo me custou caro. Liguei pra minha namorada e expliquei a situação. Foram minutos horríveis. Ela chorou, eu acabei chorando. Disse que tudo ficaria bem e que a qualquer momento eu iria vê-la. Doce ilusão. Liguei para meu irmão e ele disse que era melhor eu respeitar as ordens. Até os moradores de rua foram deslocados para lugares fechados, tipo galpões e tal.

Toda essa bagunça me fez pensar numa coisa: E os doentes? O que uma pessoa teria que fazer se fosse infectada pelo vírus? Nenhuma solução lógica apareceu na minha cabeça. Solicitaríamos uma ambulância? Eles realmente viriam nos buscar?

Fiz a única coisa que tinha pra se fazer: Grudei na TV com o notebook no colo. Noticias? Nada. Nenhuma. Zero. Na internet tudo estava desatualizado. As redes sociais era uma bagunça. Idiotas de plantão diziam coisas absurdas sobre os acontecimentos recentes. Fim do mundo, apocalipse, punição divina, etc. Era disso pra pior. Na TV só havia programação repetida. Séries, desenhos, novelas. De vez em quando um noticiário repetido dizendo que não devíamos ter contato com os infectados e que permanecêssemos em nossas residências. Às vezes davam algumas noticias como saques em lojas e supermercados, bandidos entrando em conflito com a polícia. Coisas do tipo. Nesse dia eu caminhei um pouco pelo prédio e senti no peito a tensão que pairava sobre todos. Era assustador. Subi no terraço e olhei para a cidade. Era apavorante. Ruas desertas. Viaturas patrulhando as ruas. Pessoas nas janelas de outros prédios olhando para o nada. Choros de crianças. Até quando viveríamos assim? O ser humano não está acostumado com esse tipo de vida. Precisamos de contato, de convívio com outro ser humano. Não sei como estamos há mais de um mês aguentando isso. É sufocante, inquietante, apavorante. Não consigo parar quieto. Durmo pouco. Vivo grudado na TV que infelizmente deixou de dar novas noticias há muitos dias. Vira e mexe William Bonner aparece dando a mesma mensagem de sempre: Não manter contato com infectados. Ele está acabado. Sua cara é de total desgaste e cansaço. Aparentemente tem feito esses plantões de sua casa. Ele não é o mesmo desde que Fátima Bernardes faleceu, infectada pelo vírus. Triste. Hoje fiquei a tarde inteira na área de lazer do meu apartamento. Apesar do frio que faz eu precisava de ar fresco, mesmo sabendo que esse mesmo ar nos trouxe uma praga. Uma praga que nos transformou em presos, encarcerados em nossas próprias casas. Lá encontrei um rapaz. Seu nome é Rodrigo. Gente boa. É magro, alto, o cabelo curto e bagunçado, típico dos rapazes de hoje em dia. Tem dezessete anos. Ele é conhecido de um homem que mora no prédio. Sua história é um pouco triste e angustiante. Ele está com a mãe doente em sua casa. Tomou coragem e ousadia e saiu escondido na rua para ir até uma farmácia aqui perto. No meio do caminho foi avistado pela policia e correu. A primeira coisa que imaginou foi entrar aqui, já que tinha um conhecido morando no prédio. Assim que policia viu que ele tinha entrado no prédio, resolveu relevar a aventura do rapaz. Porem agora ele está desesperado sem saber como está a situação da mãe que ele deixou. Rodrigo está ficando no apartamento do senhor Francisco, professor dele no ensino médio. Ele comentou que o senhor Francisco está com a esposa doente também. Ela fica isolada dos demais na casa. Lá vivem o senhor Francisco, a esposa e dois filhos. Por muitas vezes eu vi Rodrigo estudando uma maneira de voltar pra sua casa. Não sei se vai conseguir. É triste. O policiamento está mais rigoroso nos últimos dias. Mesmo com a situação delicada, Rodrigo é um cara super tranquilo, engraçado. São Paulino roxo. Lamentou a noticia do falecimento do craque Raí, também infectado pelo vírus. Por coincidência o apartamento de seu professor é do lado do meu. Prometemos manter contato. Finalmente alguém pra conversar. Sempre ligo para meu irmão e minha namorada. Dou risada com eles, choro com eles. Mas não é o mesmo. Agora estou sentado no sofá. Na emissora Globo a programação acabou há poucos minutos. Agora só aquela tela colorida com aquele barulho irritante. De minutos em minutos uma frase passa pela tela: “Voltaremos assim que possível com mais noticias”. Não sei mais o que fazer. Na verdade ninguém mais sabe o que fazer.

Pra piorar as coisas estou sentindo uma dor horrível no corpo e uma forte dor de cabeça. Era só o que me faltava contrair esse vírus horrível. Não me lembro de ter tido contato com alguém infectado. Espero que não seja nada demais. Vou me agasalhar mais, pois realmente está fazendo frio. Talvez eu prepare algo diferente pra comer. Agora a pouco eu vi três ambulâncias saindo em disparada pela rua. Dois minutos depois quatro viaturas da polícia foram pelo mesmo caminho. Estamos acostumados com barulho de carros, buzinas e coisas do tipo, que quando ouvimos algo diferente ficamos pensando o que poderia ser. Digo isso porque acho que ouvi uns barulhos estranhos uns dez minutos depois que as viaturas passaram aqui embaixo. Não entendo muito bem, mas acho que eram tiros. Não sei. Se alguém tiver ouvido os mesmos barulhos comenta ai. Às vezes eu estou falando bobeira e tudo não passa de uma coisa normal.

Vou lá. Abraços.

Postado 28/07/2012 ás 22h43. Taubaté-SP

4º Registro - Princípio do caos - Parte 4 de 7


Ontem chorei feito um bebê no telefone com minha namorada. Essa porcaria toda está afetando nossas mentes. Que falta faz um abraço de uma pessoa amada nesses tempos difíceis. Meu irmão, coitado. Faz dias que ele não sabe o que é descansar. Está vivendo no quartel militar. Sempre tento ligar pra ele pra saber como andam as coisas, pra saber se ele sabe de alguma notícia. Porem ele não sabe de nada. Só recebe ordens. Mas enfim. Continuemos.

Foi no dia 10/07/2012, uma terça-feira, quando as vacinas para a Influenza Z começaram a ser distribuídas no Brasil. Naquele momento as mortes no Brasil já passavam dos seis mil. Bem mais que em 2009. Os casos confirmados eu nem faço ideia de quantos eram. Os governos municipais insistiam em aconselhar a ninguém viajar para fora de suas cidades enquanto não fosse seguro. Isso era mais do que óbvio.

O medo tomou conta da população. Era nítido na rua ver os transportes públicos praticamente vazios. Pessoas com mascaras. Hospitais superlotados. Era o caos. Ainda bem que a rede de ensino estava em férias. Ganhamos duas semanas de férias coletivas no trabalho. E acho que praticamente todos os trabalhadores fizeram isso. Muitas lojas fecharam as suas portas e assim permaneceram. Eventos esportivos foram suspensos. Na TV só se falava do vírus. Era nítido ver que as emissoras estavam trabalhando com pessoal reduzido. As pessoas iam se ausentando de seus trabalhos, ora pela doença do vírus, ora por precaução. Era triste ver a nota de falecimento de famosos da TV, jogadores de futebol. Realmente triste. Nas cidades os supermercados ficaram superlotados. Todos pensaram o mesmo: Abarrotar suas despensas e ficar em casa. Quem diria que alguns dias depois a ideia de ficar em casa se tornaria uma ordem. Mas estou me antecipando aos fatos.

Rapidamente meu irmão e eu fomos tomar nossas vacinas. Foi quando meu irmão disse que o exército iria ficar de prontidão para algum problema maior. Como assim? Algum problema maior do que o problema que já estava acontecendo? “São ordens” disse ele. Isso mexeu com minha cabeça. Porque o exército ficaria de prontidão para algum problema maior? É lógico que estávamos todos ferrados com essa gripe. Mas um problema maior? Meu Deus. Assim que cheguei em minha residência fui fuçar a internet para saber se algo mais estava acontecendo no mundo. As noticias eram poucas e quase sem informação nenhuma. No México finalmente uma noticia surgiu. Calderón enviou uma solicitação de próprio punho para Barack Obama, presidente americano, solicitando a presença da equipe do CDC (Centers for Disease Control, ou Centro de controle de Doença em português). A solicitação dizia que o CDC deveria analisar os infectados pelo vírus antes que os mesmos viessem a óbito. Assustador.

Infelizmente alguns conhecidos contraíram a gripe e não aguentaram. Vieram a falecer. Foram dias tristes. Em menos de quatro dias compareci a cinco velórios. Um deles foi de um colega de trabalho. Um homem de cinquenta e poucos anos que deixou esposa e três filhos. Era de cortar o coração. O velório estava praticamente vazio. Só familiares e amigos BEM próximos. Muitas pessoas usavam mascaras e evitavam contato físico, como um abraço de consolação.

Nos dias que se seguiram as coisas começaram a ir para o buraco. E foi quando minha namorada e eu decidimos encarar o desafio de ir até o supermercado e abarrotar a minha despensa. Compramos de tudo um pouco. Principalmente comida congelada e enlatados. Meu irmão aproveitou um dia de descanso e trouxe dez pacotes de ração militar. Aquele troço é ruim pra burro, mas é uma mão na roda. Meu irmão nos ensinou a usar. É só colocar agua quente num pacotinho de arroz e já era. Bom apetite.

No mundo as coisas estavam se ferrando de vez. As fronteiras internacionais estavam fechadas. Aeroportos, portos marítimos e todo o tipo de fronteira existente. Ninguém saia ou entrava em qualquer país com casos do vírus. Não havia mais informação sobre o numero de infectados e nem o numero de mortos. Nem mesmo no Brasil. Na internet as noticias eram desatualizadas. Na TV os principais jornais davam plantão de hora em hora para dizer uma coisa ali, uma coisa aqui, mas nenhuma noticia concreta e esclarecedora. A única noticia interessante que tivemos foi que o CDC retornou do México e disse que o vírus realmente havia se transformado e que era extremamente perigoso para a humanidade. Um cientista aconselhou evitar qualquer tipo de contato com quem apresentasse um dos sintomas da Influenza Z. Aconselhou também que todos tomassem a vacina contra o vírus. De resto não sabíamos mais nada. Segundo um blog americano, o presidente Obama havia se retirado da Casa Branca e ido para um abrigo militar secreto. Por falar em blogs, eu vi um blog de uma amiga. Ela é enfermeira no Hospital Regional aqui de Taubaté. No blog ela relatava o caos que era o hospital. Corredores superlotados de pessoas doentes. Eram tantas pessoas que muitos faleciam no corredor e só eram notados dias depois, quando começava a cheirar verdadeiramente mal. Os mortos eram empacotados em sacos pretos e largados num enorme galpão atrás do hospital. Esse era o terror que estava acontecendo a menos de dois quilômetros do meu apartamento. O inferno estava tomando conta da terra.

Postado 27/07/2012 ás 12h07. Taubaté-SP

3º Registro - Princípio do caos - Parte 3 de 7

Hoje acordei por volta das dez horas da manha. Assim que me levantei abri a janela e olhei para a rua. Uma cena tirada de um filme amador de terror. Tudo vazio. Deserto. A não ser por umas constantes viaturas da policia ou do exército que passam por aqui. Indo pra Deus sabe lá onde. É bizarro ver os policiais ou os militares trafegando na rua com máscaras protetoras. Como se um terrível gás tivesse sido lançado na cidade.

Meu apartamento fica no centro da cidade e aqui costumava ser uma bagunça essas horas da manha. O barulho do transito era constante e irritante. Agora sinto falta dele. Bons tempos. Enfim... Vejamos onde parei.

Foi logo depois que o presidente dos EUA disse que vacinas seriam liberadas para o grupo de risco. Eu me lembro de que fui para a casa da minha namorada e lá meus sogros não paravam de comentar sobre o assunto. “E se chegar ao Brasil?” “O país não está preparado” “Vai ser um caos”. Pois é. E eles estavam totalmente certos.

29/06/2012. O primeiro caso confirmado da gripe no Brasil aconteceu menos de um dia depois. Os casos no mundo inteiro já passavam de dois mil e as mortes se aproximavam assustadoramente dos cinquenta por cento, ou seja, quase mil mortes. Foi na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul que foi confirmado o primeiro caso. Depois disso, desandou. No final do dia os casos já se aproximavam dos cento e cinquenta. Era muito rápida a propagação do vírus. Em quase todas as capitais havia casos confirmados. E o papo de que as providencias cabíveis estavam sendo tomadas? Pelo amor. Quanta falta de preparação de um governo. A OMS elevou o nível de alerta pandêmico para 5, o que significava que o risco de pandemia era eminente.

O ponto principal do vírus ainda era o México e parecia que alguma coisa fora do normal estava acontecendo lá. É claro que está acontecendo uma coisa fora do normal. Um vírus que mata em menos de 24 horas é totalmente anormal. Ou seria algo diferente? Só sei que nenhuma informação concreta foi passada pela imprensa. Parecia que ninguém queria realmente dizer o que estava acontecendo em Cocula (cidade que teve o primeiro caso da gripe). Não havia imagens ou noticias daquele vilarejo.

E tudo piorou ás 12h45 do dia 01/07/2012, dois dias depois do primeiro caso confirmado no Brasil, quando foi ao ar uma coletiva de imprensa do então presidente do México, Felipe Calderón. Ele entrou no salão de imprensa vestindo um uniforme militar. Na mão trazia um papel (com certeza seu discurso). Quando todos achavam que ele ia dizer que tudo estava no controle e que não devíamos ter pânico, ele soltou a bomba. Estava declarando a lei marcial no país. Isso chocou o mundo. Em poucos minutos alguns sites e canais de TV já declaravam que uma reunião de extrema urgência havia sido marcada pelo G8. E o anuncio de Calderón não parou por ai. Ele decretou que qualquer informação sobre o país teria que passar por uma base pré-estabelecida pelo governo que decidiria se a notícia iria se tornar publica ou não. Para fechar com chave de ouro sua entrevista, ele declarou também que a partir daquele momento ninguém saía e ninguém entrava no México. Todas as fronteiras estavam sendo fechadas até segunda ordem. Todos os aeroportos e portos marítimos estavam sendo fechados. Mas porque isso? Era pra tanto? O que estava acontecendo de verdade? O presidente do México deixou a sala de imprensa e no seu lugar ficou um general do exército. Ele falou algumas coisas e a transmissão foi cortada. A imprensa explodiu com essa noticia. Em todos os canais abertos só se falava nisso. Nos canais de noticias pela TV a cabo os plantões eram de 24 horas. A todo o momento eles só falavam do México e da Influenza Z. Foi então que na semana que se seguiu tudo foi para o saco. A OMS elevou o nível de alerta pandêmico para 6 e declarou pandemia. O vírus precisava ser extinto.

05/07/2012. Pra começar, o Brasil começou realmente a sentir o efeito do vírus. Em menos de quatro dias os infectados já passavam de dez mil. Isso mesmo. Dez mil só no Brasil. As mortes já passavam os dois mil. A presidente encomendou imediatamente as novas vacinas, que já estavam sendo distribuídas na Europa e na América Central havia mais de uma semana. Em Taubaté o primeiro caso foi registrado no bairro Jardim das Nações. E em menos de dois dias os casos já passavam dos duzentos. As mortes em Taubaté eram um total de doze ou treze, segundo informações. Ninguém conhecido.

Do México nada se sabia. As notícias eram todas desatualizadas. Não havia notícia nenhuma depois da entrevista coletiva de Calderón. Pra piorar as coisas o G8 havia se reunido e foi decidido que as viagens aéreas internacionais estavam suspensas até segunda ordem. Os governos também aconselhavam a população a evitarem os locais com aglomeração de pessoas, como transporte publico, festas noturnas e por ai vai. Déjà Vu. 2009 estava se repetindo. E mil vezes pior.

Vou parar por aqui. Vou ligar pra minha namorada. Preciso falar com ela. Até mais.

Postado 26/07/2012 ás 21h14. Taubaté-SP

2º Registro - Princípio do caos - Parte 2 de 7

Obrigado pessoal. É bom saber que vocês estão aqui. Que estão comigo, me acompanhando nesse caos. Também estou lendo os seus relatos e vou acompanhar passo a passo essa situação terrível. Talvez possamos dar umas boas risadas quando isso acabar. Espero que isso não seja uma doce ilusão. Estou mantendo contato com meu irmão e minha namorada pelo telefone, mas não é o suficiente. Preciso estar com eles, dar um abraço, um beijo. Obrigado pelas mensagens de apoio. Sei que vamos dar a volta por cima. Ontem infelizmente mais uma coisa triste aconteceu. As sirenes que acusei ter ouvido estavam na portaria do prédio onde moro. Um homem de quarenta e poucos anos foi levado com emergência para o hospital. As coisas estão piorando.

Agora vou continuar de onde parei. Atendendo ao pedido de muitos.

28/06/2012. No dia seguinte ao primeiro plantão noticiário eu acordei bem cedo. Eu precisava resolver algumas coisas antes de trabalhar e a melhor hora para fazer isso era de manha. Me sinto mais disposto pela manha do que depois do almoço. Assim que liguei o computador e abri no site de noticias (coisas que faço quase todo o dia) fui bombardeado por notícias da propagação do vírus Influenza A. Isso tudo em menos de 12 horas. No México o numero de infectados passava de duzentos. As mortes passavam de vinte. Praticamente dez por cento dos infectados vinham a óbito. Havia também casos suspeitos nos EUA, Espanha, Itália, França e Irlanda. Até aquele momento nada se falava do Brasil. Fui resolver as minhas coisas preocupado com esses acontecimentos. Não queria de jeito nenhum mais momentos de medo como em 2009. No restante do dia eu fiquei alheio às informações mundiais. Fiz o que precisava fazer, atendi meus clientes e fui embora. Assim que fui checar meus e-mails, vi no site G1.com que a coisa realmente estava ficando séria. Cientistas já estavam confirmando que realmente o vírus que estava infectando as pessoas no México era uma mutação do Influenza A, ou uma nova cepa, para os conhecedores do assunto. Alguns já davam o nome de Influenza Z. Não sei por quê. Talvez tivesse relação com o cientista que descobriu o novo vírus. No fim do dia os casos da gripe Z já passavam de oitocentos. Isso mesmo. Mais de seiscentos novos casos em menos de dez horas. As mortes passavam de setenta. Casos foram confirmados em quase todos os países da Europa, América Central e alguns países da África. Naquele momento a OMS elevou o nível de alerta pandêmico de 1 para 4. Aquilo surpreendeu a todos. A OMS classifica os níveis de alerta entre 1 e 6. O nível 4 significava que o vírus era transmitido de pessoa para pessoa, com possíveis surtos localizados. O governo brasileiro lançou uma nota oficial dizendo que a população não precisava entrar em pânico, pois todas as providencias cabíveis já estavam sendo tomadas para que o vírus não entrasse em solo brasileiro. Brasileiros que estavam nos países com casos confirmados teriam que passar por uma bateria de exames antes de voltarem para o país. Que merda! Levemente as coisas já estavam começando a complicar. Antes de eu ir pra casa da minha namorada eu li na internet que o presidente dos EUA deu uma entrevista coletiva, afirmando que novas vacinas já estavam prontas para serem distribuídas para a população de risco, no caso os idosos, crianças menores de 2 anos, gestantes, doentes crônicos e assim por diante. Aquilo estava começando a cheirar problema. Misericórdia. Tudo isso em menos de três dias.

Preciso parar por aqui. Tenho que limpar meu apartamento. Faz duas semanas que ele não sabe o que é uma faxina. Hoje ouvi mais do que nunca sirenes pela cidade inteira. Tomara que nada mais sério esteja acontecendo. Boa noite pessoal.

Postado 25/07/2012 ás 21h14. Taubaté-SP

1° Registro - Princípio do caos – Parte 1 de 7

Preciso me comunicar. Extravasar esse sentimento de pânico, medo, terror e angustia. O mundo não é o mesmo desde que toda aquela merda começou... Aquela merda... Estamos trancafiados em nossas residências. Isolados de um mal que nos assola por todos os cantos. Não podemos pisar na rua. Não podemos ter contato com outro ser humano. É proibido. Extremamente proibido. Que bosta de vida! Tudo está um inferno desde que foi decretada essa “quarentena residencial”. Estou relatando isso para não enlouquecer. Não consigo ficar parado. Na TV só se sabe falar desse caos. Mais nada. Na internet é o mesmo. Inúmeros sites nos trazem as noticias em tempo real. É só tragédia. Queria poder conversar com alguém. Meu irmão, minha namorada. Meu irmão está numa situação muito complicada. Militar a um ano e meio ele está totalmente a serviço da cidade, monitorando e patrulhando as ruas de Taubaté. Minha namorada está em sua casa, com os pais. Ela mora na cidade vizinha. Uns 20 minutos de carro. Preciso vê-los. Vou enlouquecer se continuar nesse apartamento. Não adianta sair no corredor. Ninguém ousa colocar a cabeça pra fora da porta. Estão todos presos em seus apartamentos. Converso com algumas pessoas pela internet, com meu irmão e minha namorada pelo celular, mas não é a mesma coisa. Só sabem falar do que aconteceu. Do enorme problema que estamos passando.

Tudo começou há mais ou menos um mês atrás, no inicio do inverno. 25/06/2012. Todos levavam suas vidas normalmente. Sempre tivemos problemas em nossa volta e muitos deles passavam despercebidos. Mas esse problema começou a tomar uma proporção global fora do comum. Os que antes eram casos isolados começaram a tomar espaço na mídia. Era simples e assustador: O vírus H1N1, mais conhecido como Influenza A ou "gripe suína" havia retornado. Mas desta vez ele era uma mutação do antigo vírus, que matou mais de dezoito mil pessoas (duas mil pessoas só no Brasil) em meados de 2009. Esse acontecimento foi previsto em 2010 e depois novamente em 2011. Mas nunca aconteceu. Infelizmente de 2012 não passou. O primeiro caso foi registrado novamente no México. Mesmo local que foi registrado o primeiro caso da Influenza A. Porem ninguém sabia ou não queria dar uma informação mais concreta. Talvez para não assustar o povo.

27/06/2012. Passaram-se dois dias quando eu comecei a perceber que as coisas estavam fora do normal. Era quase onze horas da noite quando um plantão de notícias interrompeu a programação da TV. Eu estava no sofá com minha namorada enquanto meu irmão pedia uma pizza pelo telefone. Além de a notícia ser ruim o repórter não ajudava em nada, pois ele falava de um jeito assustador. Ele foi simples e claro: Em menos de dois dias foram confirmados “alguns”, isso mesmo, alguns casos da nova gripe na América do Norte, precisamente no México, num vilarejo chamado “Cocula”. Desses “alguns” casos haviam sido confirmadas cinco mortes. Ele falou que o plantão voltaria com mais noticias no decorrer da noite. E assim a programação voltou ao normal. Ficamos um pouco assustados. É lógico que inúmeras mortes por inúmeros vírus acontecem todos os dias no mundo. Mas ficamos mais assustados por recordarmos o susto que levamos em 2009. Eu me lembro até hoje. O retorno para as aulas em toda a rede de ensino foi adiado. Pediam para evitarmos o transporte publico e lugares fechados com muitas pessoas. Só no Brasil havia mais de cinquenta mil casos confirmados da gripe. Foi um terror. A Organização Mundial de Saúde (OMS) decretou em pouco mais de 1 mês que a situação era de nível 6, ou seja, era decretada a pandemia. Graças a Deus quase 1 mês depois de decretada a pandemia tudo começou a voltar ao normal quando o vírus começou a regredir. São essas lembranças que nos deixou assustados. Não queríamos passar por isso novamente. Naquela noite eu não sei se o plantão voltou, pois ficamos assistindo filme.

Vou parar de escrever. Preciso descansar um pouco. Se o pessoal gostar do que eu escrevi aqui, eu continuo escrevendo. Sei que todos estão necessitando de contato e isso pode ser uma forma de nos mantermos ligados e unidos. Agora a pouco ouvi sirenes. Alguma coisa está acontecendo aqui na rua. Vou dar uma checada.

Boa noite.

Postado 24/07/2012 ás 20h32. Taubaté-SP