5º Registro - Princípio do caos - Parte 5 de 7


O dia 17/07/2012 (uma semana depois das vacinas serem liberadas no Brasil) amanheceu com uma bomba. A presidente do Brasil declarou ao vivo na TV que a lei marcial estava sendo decretada no país. A partir daquele momento quem mandava eram os militares. Um homem subiu ao palco. Tinha os cabelos brancos, um pouco magro, barba por fazer e cara de poucos amigos. Seu nome era Enzo Martins Peri. General comandante do Exército Brasileiro. Ele decretou em todo o país a “quarentena residencial”. Todo o cidadão do país deveria ficar em sua residência até segunda ordem. O exército e a policia ficariam encarregados de patrulharem as ruas e certificarem que todos estavam cumprindo essa “ordem”. Qualquer pessoa que fosse encontrada na rua seria levada para a delegacia e ali permaneceria até segunda ordem. Tudo até segunda ordem. Isso já estava dando nos nervos. Eu não tive tempo pra nada. Desci pro estacionamento, mas quando estava saindo na rua uma viatura bloqueou meu caminho e ordenou que eu retornasse. Hoje eu fico pensando que poderia ter mentido pra eles e falar que estava indo pra minha casa. Mas no momento eu não tive reação e voltei. Merda. Aquilo me custou caro. Liguei pra minha namorada e expliquei a situação. Foram minutos horríveis. Ela chorou, eu acabei chorando. Disse que tudo ficaria bem e que a qualquer momento eu iria vê-la. Doce ilusão. Liguei para meu irmão e ele disse que era melhor eu respeitar as ordens. Até os moradores de rua foram deslocados para lugares fechados, tipo galpões e tal.

Toda essa bagunça me fez pensar numa coisa: E os doentes? O que uma pessoa teria que fazer se fosse infectada pelo vírus? Nenhuma solução lógica apareceu na minha cabeça. Solicitaríamos uma ambulância? Eles realmente viriam nos buscar?

Fiz a única coisa que tinha pra se fazer: Grudei na TV com o notebook no colo. Noticias? Nada. Nenhuma. Zero. Na internet tudo estava desatualizado. As redes sociais era uma bagunça. Idiotas de plantão diziam coisas absurdas sobre os acontecimentos recentes. Fim do mundo, apocalipse, punição divina, etc. Era disso pra pior. Na TV só havia programação repetida. Séries, desenhos, novelas. De vez em quando um noticiário repetido dizendo que não devíamos ter contato com os infectados e que permanecêssemos em nossas residências. Às vezes davam algumas noticias como saques em lojas e supermercados, bandidos entrando em conflito com a polícia. Coisas do tipo. Nesse dia eu caminhei um pouco pelo prédio e senti no peito a tensão que pairava sobre todos. Era assustador. Subi no terraço e olhei para a cidade. Era apavorante. Ruas desertas. Viaturas patrulhando as ruas. Pessoas nas janelas de outros prédios olhando para o nada. Choros de crianças. Até quando viveríamos assim? O ser humano não está acostumado com esse tipo de vida. Precisamos de contato, de convívio com outro ser humano. Não sei como estamos há mais de um mês aguentando isso. É sufocante, inquietante, apavorante. Não consigo parar quieto. Durmo pouco. Vivo grudado na TV que infelizmente deixou de dar novas noticias há muitos dias. Vira e mexe William Bonner aparece dando a mesma mensagem de sempre: Não manter contato com infectados. Ele está acabado. Sua cara é de total desgaste e cansaço. Aparentemente tem feito esses plantões de sua casa. Ele não é o mesmo desde que Fátima Bernardes faleceu, infectada pelo vírus. Triste. Hoje fiquei a tarde inteira na área de lazer do meu apartamento. Apesar do frio que faz eu precisava de ar fresco, mesmo sabendo que esse mesmo ar nos trouxe uma praga. Uma praga que nos transformou em presos, encarcerados em nossas próprias casas. Lá encontrei um rapaz. Seu nome é Rodrigo. Gente boa. É magro, alto, o cabelo curto e bagunçado, típico dos rapazes de hoje em dia. Tem dezessete anos. Ele é conhecido de um homem que mora no prédio. Sua história é um pouco triste e angustiante. Ele está com a mãe doente em sua casa. Tomou coragem e ousadia e saiu escondido na rua para ir até uma farmácia aqui perto. No meio do caminho foi avistado pela policia e correu. A primeira coisa que imaginou foi entrar aqui, já que tinha um conhecido morando no prédio. Assim que policia viu que ele tinha entrado no prédio, resolveu relevar a aventura do rapaz. Porem agora ele está desesperado sem saber como está a situação da mãe que ele deixou. Rodrigo está ficando no apartamento do senhor Francisco, professor dele no ensino médio. Ele comentou que o senhor Francisco está com a esposa doente também. Ela fica isolada dos demais na casa. Lá vivem o senhor Francisco, a esposa e dois filhos. Por muitas vezes eu vi Rodrigo estudando uma maneira de voltar pra sua casa. Não sei se vai conseguir. É triste. O policiamento está mais rigoroso nos últimos dias. Mesmo com a situação delicada, Rodrigo é um cara super tranquilo, engraçado. São Paulino roxo. Lamentou a noticia do falecimento do craque Raí, também infectado pelo vírus. Por coincidência o apartamento de seu professor é do lado do meu. Prometemos manter contato. Finalmente alguém pra conversar. Sempre ligo para meu irmão e minha namorada. Dou risada com eles, choro com eles. Mas não é o mesmo. Agora estou sentado no sofá. Na emissora Globo a programação acabou há poucos minutos. Agora só aquela tela colorida com aquele barulho irritante. De minutos em minutos uma frase passa pela tela: “Voltaremos assim que possível com mais noticias”. Não sei mais o que fazer. Na verdade ninguém mais sabe o que fazer.

Pra piorar as coisas estou sentindo uma dor horrível no corpo e uma forte dor de cabeça. Era só o que me faltava contrair esse vírus horrível. Não me lembro de ter tido contato com alguém infectado. Espero que não seja nada demais. Vou me agasalhar mais, pois realmente está fazendo frio. Talvez eu prepare algo diferente pra comer. Agora a pouco eu vi três ambulâncias saindo em disparada pela rua. Dois minutos depois quatro viaturas da polícia foram pelo mesmo caminho. Estamos acostumados com barulho de carros, buzinas e coisas do tipo, que quando ouvimos algo diferente ficamos pensando o que poderia ser. Digo isso porque acho que ouvi uns barulhos estranhos uns dez minutos depois que as viaturas passaram aqui embaixo. Não entendo muito bem, mas acho que eram tiros. Não sei. Se alguém tiver ouvido os mesmos barulhos comenta ai. Às vezes eu estou falando bobeira e tudo não passa de uma coisa normal.

Vou lá. Abraços.

Postado 28/07/2012 ás 22h43. Taubaté-SP

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