Mais uma vez me lembrei de minha namorada. A dor tomou conta do
meu coração. Não queria imaginar que ela estaria morta, e muito menos imaginar
que ela poderia ser uma dessas criaturas. Com certeza eu precisaria ir até a
casa dela. Não iria conseguir viver imaginando como ela estaria. Eu teria que
ver com meus próprios olhos. Foi então que percebi algo. Silencio. Sim,
silencio. Um silencio matador, aterrorizante. Eu não conseguia ouvir nada. Os
gemidos e os passos daquelas criaturas. Tudo estava estranhamente quieto. Olhei
pela janela e não vi ninguém na rua. Nada. Estava deserta. Apesar de que tudo
estava muito escuro. Ao longe, na rua que subia para a área de lazer do
condomínio eu percebi que a concentração das criaturas ainda era lá.
Era hora de agir. Decidi que preciso ajudar aquela moça. Novamente
pensei em como fazer isso. Não seria tão difícil sem aquelas criaturas por
perto. Precisava somente entrar na cada dela e tirá-la de lá. Mas tinha que ser
rápido. Não sabia até quando iria durar essa “paz” nas ruas. Peguei uma
vassoura. Não, não vou fazer uma faxina. Percebi que eles são atraídos pelo som
e talvez pelo cheiro. Os dois tiros que Rodrigo disparou chamou a atenção de
muitos. Mas algo na área de lazer chamou ainda mais.
Assim que abri a porta da casa, por alguns segundos pensei em
voltar. Mas respirei fundo e fui. Rapidamente peguei uma pedrinha na rua e
lancei na janela em que a menina havia aparecido quando eu estava olhando a rua
da janela. Nada. Eu ouvi um barulho e me virei, mas não percebi nada. Só minha
sombra. Eu estava vendo a hora que iria quebrar a vassoura na cabeça da minha
sombra. Enquanto aguardava a moça aparecer na janela, eu me lembrei de algo, a
arma do homem morto. Me aproximei do cadáver, estava fedendo muito. Tive ânsia
de vomito. O corpo estava dilacerado. Não tinha braço e suas tripas estavam
espalhadas pelo chão. O rosto não existia. Ao lado do corpo estava a arma. Uma
pistola. Era prateada e grande. Fiquei pensando o que aquele homem fazia da
vida para ter uma arma daquela em casa. Não era arma típica da policia e muito
menos do exército. Foi quando vi a moça surgir na janela. Ela ficou espantada.
Acho que por alguns segundos ela achou que eu fosse um zumbi, até que o inteligente
aqui teve a idiotice de gritar meu nome.
– Meu nome é Gabriel. Vim tirar você dai. – gritei.
De repente alguém surgiu caminhando do corredor da casa vizinha.
Eu não esperei para saber quem era. Corri para a porta da casa da moça. A
criatura foi se aproximando lentamente. Ela não andava tão rápida assim.
Parecia estar bêbada e com sono. Mas mesmo assim eu não tinha saída. Ou entrava
ou teria que matar o zumbi. Segurei forte o cabo da vassoura nas mãos e dei uma
paulada no zumbi sem pensar. Não foi forte o suficiente, mas a criatura
cambaleou e caiu para trás. A porta se abriu atrás de mim e entrei.
Imediatamente coloquei coisas segurando a porta. Antes tive tempo de distinguir
mais duas criaturas se aproximando da varanda.
Me aproximei da moça e me apresentei novamente. Rapidamente
expliquei minha situação e a convidei para ir comigo até a casa do Rodrigo.
Felizmente ela o conhecia. Seu nome é Amanda e ela também tem dezessete anos.
Amanda me contou rapidamente sobre o plano de seu pai que acabou
tragicamente.
Assim como todo mundo, o senhor Alberto (nome do pai dela) acordou
no meio da noite com toda aquela confusão. Decidiu sabiamente esperar a poeira
baixar. Ele também percebeu que não seria uma boa ideia sair no meio daquelas
pessoas estranhas que estavam atacando as outras na rua. Foi então que ele
começou a bolar seu plano. Ele arrumou todas as coisas necessárias para uma
fuga e se preparou. Foi quando o plano entrou em ação. Rapidamente ele e sua
filha colocaram as coisas no carro e se preparam para partir. A frente de sua
casa estava vazia, o que fez tudo ficar mais fácil. Assim que ele arrancou com
o carro, freou com tudo e parou. Amanda, que estava no banco de trás segurando
algumas caixas, não entendeu. Seu pai parecia ter esquecido alguma coisa. Ele
saiu do carro e foi em direção a casa, quando um zumbi se aproximou. Então
aconteceu toda aquela tragédia.
Perguntei se eles ouviram os tiros que vieram da casa de Rodrigo.
Ela respondeu que ouviram, mas que infelizmente não sabiam da onde vinha o
barulho. O estranho era que eles não perceberam nossa chegada ao condomínio.
Amanda contou que, quando ainda estava no carro, percebeu a
distração de um zumbi e abriu a porta do carro com tudo, fazendo a criatura
cair. Então ela correu e se trancou em sua casa. O plano de seu pai era pegar
sua ex-esposa, mãe de Amanda, e irem para a base de aviação do exército, aqui
em Taubaté. O mesmo plano que o nosso. Realmente parece ser um bom plano. Se
existe um local seguro, é lá.
Convenci Amanda a arrumar suas coisas e ir comigo para a casa do
Rodrigo. Assim que voltamos pra casa, expliquei TODA a situação e TODO o
ocorrido ali dentro. Amanda ficou em choque e se lamentou pela mãe de Rodrigo,
que por sinal ela conhecia muito os dois. Contou que os dois já tiveram um caso
ano passado e que ficaram três meses juntos. Depois não deu certo. Mas sempre
foi muito amiga do Rodrigo. Contou também que quando tudo começou os dois
trocaram constantes mensagens de celular, internet e prometeram manter contato,
mesmo que fosse das janelas das casas. Foi então que certo dia ela notou o
sumiço de Rodrigo. Depois não viu mais o amigo nos dias que se seguiram. Não
pôde ir visitar o amigo e a mãe porque seu pai não a deixava sair de casa. Foi
então que tudo aconteceu.
Contei meu plano para Amanda, mas também contei da situação de
Rodrigo. Dificilmente ele viria comigo, e eu precisava muito ir procurar minha
namorada. Nas horas que se seguiram, Rodrigo acordou e ficou lá em cima. Não
quis descer e encontrar comigo. Amanda se ofereceu para conversar com ele.
Fiquei na sala por um bom tempo sozinho. Amanda estava cuidando de Rodrigo. Ela
descia para a cozinha, preparava algo para comer e levava para ele. Certa hora
eu perguntei para ela como ele estava.
– Ele não fala nada Gabriel. – disse ela. – Não responde, não
agradece e não fala mal. Falei com ele sobre sairmos daqui, mas ele não esboçou
reação alguma.
– Entendo. – disse eu. – Você tem que entender que uma hora ou
outra eu vou precisar partir Amanda.
– Entendo. – ela falou.
– Você vai ficar ou ir comigo? – perguntei.
– Não sei Gabriel. Ver o Rodrigo nessa situação corta meu coração.
Um rapaz tão tranquilo.
– Pense direito. Acho que amanha pela manhã eu vou partir. Ai você
me responde. Vou aproveitar que ainda está dia e vou me livrar do corpo do
pobre coitado do César.
Amanda subiu para ficar com Rodrigo enquanto eu fui para o quintal
dos fundos onde havia deixado o corpo de César. Estava enrolado numa lona que
eu havia encontrado num quarto que ficava ao lado da churrasqueira no quintal.
Peguei o corpo e o larguei do outro lado da rua. Infelizmente não havia pá ou
algo do tipo para cavar um buraco e enterrá-lo. E o corpo já estava começando a
feder. Logo em seguida tomei um banho no banheiro social que havia na casa.
Preparei algo para comer e fiquei sentado no sofá. Curiosamente dei uma olhada
na TV e não encontrei nenhum canal funcionando. Na internet também não havia
nada. Imaginei que eu deveria ser o único louco a estar naquela internet
naquele momento.
As quedas de energia são constantes agora. Não sei quanto tempo
mais vai durar sem ninguém para fazer uma manutenção. Me lembrei do meu sogro.
Ele era funcionário de uma empresa de energia aqui da cidade. Minha namorada.
Que ela esteja bem. Por favor, Deus. Assim que amanhecer eu vou partir. Estou decido.
Com ou sem o Rodrigo.
Preciso encontrar aqueles que eu amo...
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