18° Registro - Sobreviventes - Parte 1 de 4

Estou vivo. Totalmente ferrado, mas vivo. Totalmente cansado, mas vivo.

Estou na casa da minha namorada. Não tenho boas notícias. Mas também não perdi as esperanças. Não tenho outra opção a não ser esperar a poeira abaixar para sair daqui. Não tenho sono nenhum. Vou escrever um pouco.

Quando você acha que tudo foi para o saco, fique tranquilo, pois tudo pode piorar.

Estou sozinho. Para ajudar, o numero de criaturas no portão aumentou.

Enfim... Ainda no condomínio, assim que entrei no carro, o liguei e sai. Não havia nenhuma criatura no trajeto de saída do condomínio, a não ser que estivessem dentro das casas. Ao passar pela portaria vi uma cena horrível. Um homem, ou o que restava dele. Do estomago pra baixo não restava mais nada dele. Isso me fez lembrar a criatura que encontrei na casa vizinha a do Rodrigo. Um homem com seus trinta e poucos anos, vestindo uma camisa preta e uma calça cinza toda rasgada e suja de sangue. Seu rosto estava todo ensanguentado e deformado, resultado das pancadas que dei. No braço estava a mordida. Uma ferida horrível e enorme. Seus olhos eram brancos e profundos. Suas mãos estavam sujas de sangue, talvez já tivesse matado alguém. Lembrei-me do berço. Merda.

Segui com o carro em direção à rua. Não vi ninguém nesse trajeto, a não ser um gol abandonado. Parei com o carro na esquina e observei. À direita eu vi alguns deles, caminhando para algum lugar. A esquerda estava livre. Infelizmente meu caminho era para a direita. Precisava encontrar outro trajeto, que felizmente já havia sido traçado como plano B. Segui pela esquerda e observei algumas casas com portões abertos e sangue por toda a parte. Realmente as pessoas foram surpreendidas na calada da noite. Não tiveram o que fazer a não ser correr e sobreviver. Muitas pelo jeito não sobreviveram. Logo em seguida saí numa estrada que ligava muitos bairros. A cena era desoladora. Carros abandonados por toda a parte. Batidos, capotados. E o pior de tudo, com gente morta dentro. No meio da estrada se via algumas criaturas vagando. Desviei de alguns carros e segui a estrada pela direita. A primeira parte do meu plano? Minha namorada com certeza. Eu precisava ter certeza do que havia acontecido com ela. Ela mora a cerca de vinte minutos de casa, uns quatro quilômetros, numa cidade vizinha a Taubaté, chamada Tremembé. Encontrei muitas criaturas durante o trajeto, mas que eram fáceis de evitar. As cenas se repetiam em quase todo o caminho. Carros e muitos carros. As pessoas com certeza tentaram fugir, mas o alvoroço foi o fim delas. As criaturas por todos os lados devem ter causados acidentes no transito. Vi carros de policia também. Com certeza receberam ligações e foram averiguar, sendo surpreendidos pelos zumbis. Pensei inúmeras vezes parar e pegar as armas dos policiais, mas era totalmente arriscado.

Agora surgiu outro mistério. Taubaté é uma cidade grande, com mais de duzentos e setenta mil habitantes. Quantas dessas pessoas viraram zumbis? Isso seria o inferno total. No caminho que fiz encontrei dezenas dessas criaturas, mas nem chegam aos pés do total de gente que vivia nessa cidade. Será que ainda serei surpreendido por milhares dessas criaturas num local só? Espero que não.

Continuei pela estrada até entrar em Tremembé. As cenas de terror se repetiam por toda a parte. Era difícil ficar olhando. Jurei ouvir sons que seriam tiros, mas não podia me dar ao luxo de ir averiguar. Foi então que me aproximei da rua da minha namorada. A visão congelou meu coração. A rua parecia ser a pior que eu vi em todo o trajeto até ali. Dezenas de carros em fila e batidos, capotados e alguns pegando fogo. E pra ajudar, dezenas de criaturas vagando por entre os carros. Algumas comiam o que parecia ser um corpo. Terror puro. Eram criaturas horríveis com amputações graves. Muitas sem braço, perna, com a barriga aberta, sem metade do rosto. Ao longe eu avistei a casa da minha namorada. O portão estava fechado e tudo parecia estar “tranquilo” por ali. Foi então que tive uma ideia. Comecei a buzinar na esquina. Iria atrair eles para mim e dar a volta no quarteirão.

Assim que percebi que os zumbis estavam caminhando até minha direção, dei a volta com o carro e sai para o outro lado do quarteirão. Não tinha como entrar de carro na rua, então minha ideia era mais perigosa ainda. Eu não podia partir sem saber o que havia acontecido. Precisava entrar naquela casa e ver com meus próprios olhos. Dei a volta no quarteirão e de longe vi que as criaturas estavam seguindo o carro, deixando a rua. Algumas criaturas insistiram em ficar, mas seriam fáceis de contornar. O perigo seria todas juntas.

Peguei o pedaço de ferro que tinha no carro e a arma. A outra arma eu havia deixado com Amanda e Rodrigo. Esperava não ter que usar nenhuma das duas opções. Percebi que outras criaturas se aproximavam do carro, então sai rapidamente e fechei a porta.

No caminho vi as cenas mais horríveis da minha vida. O cheiro de cadáveres já em fase avançada de decomposição era nauseabundo. Tive que correr com o nariz tampado por diversas vezes. Eram mortos de todos os tipos. Homens, mulheres e crianças. Crianças, pelo amor de Deus. Esquivei-me de três ou quatro criaturas que passaram a me seguir de longe. Incrível como se movem rápido quando percebem um “vivo” por perto. Cheguei ao portão da casa de minha namorada e vi o carro estacionado na garagem. Meu coração quase parou. Estava aberto e vazio. Tentei abrir o portão, mas estava trancado. Merda. Dois zumbis estavam a menos de dez metros de mim. Dei uma afastada e me empoleirei no muro. Com esforço subi e saltei para dentro da casa dela.

Tudo estava totalmente quieto.  As criaturas se aproximaram e começaram a forçar o portão. Ele tem as barras de ferro bem grossas, então não me preocupei em relação a isso. Porem o som que eles emitiam era aterrorizante. Aquilo iria me deixar louco. A casa da minha namorada tem dois corredores laterais. Pelo lado esquerdo tem a porta principal da casa e a porta do corredor. Pelo lado direito é livre. Os dois corredores saem no enorme quintal dos fundos. Chequei as duas portas do lado esquerdo e estavam trancadas. Isso me deu esperanças, sinal de que eles poderiam estar seguros. O carro estava totalmente vazio. A chave estava no contato, mas não tinha nada, como por exemplo, coisas preparadas para uma fuga. Segui pelo corredor direito e fiquei atento a qualquer coisa. Fora o som das criaturas no portão, eu não ouvia mais nada. Assim que virei o corredor e sai no quintal, meu coração quase saltou pela boca. Atrás da maquina de lavar roupas da minha sogra havia alguém, um corpo jogado. Eu só podia ver as pernas. Eram de um homem. Não tive escolha, preparei a arma. Depois do episodio da casa vizinha no condomínio eu havia destravado a bendita arma. Estava pronto para atirar. Mas e se fosse meu sogro, ou alguém conhecido? Eu seria capaz? Depois de pensar nisso, minhas mãos começaram a tremer. Lembrei-me das palavras de Rodrigo. Balancei a cabeça negativamente tentando esquecer aquelas palavras.

Aproximei-me e vi o corpo. Eu o conhecia. Era o vizinho do meu sogro. Carlos eu acho. Estava totalmente morto. Enfiado na cabeça dele havia um espeto de churrasco. Meu sogro é um churrasqueiro nato, e eu havia dado aquele jogo de espetos para ele no natal. Vejo que lhe foi útil. Definitivamente o vizinho havia se tornado um zumbi e tentado atacar alguém aqui dentro. Isso me fez gelar. Tomara que não tenha conseguido. A porta dos fundos estava aberta, o que me fez tremer ainda mais. Chamei pelo nome de minha namorada, que por sinal é Mirian. Não houve resposta. Entrei lentamente na casa olhando para todos os cantos. Assim que passei pela cozinha vi o que por algum instante me acalmou. Tudo estava revirado e vazio. Eles provavelmente se prepararam e fugiram. Não havia alimentos na casa. Entrei no quarto de minha namorada e também estava revirado. Roupas, entre outras coisas. Tudo. Fiquei feliz por saber que eles não haviam virados zumbis, mas preocupado.

Onde eles poderiam estar?

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