24° Registro - A Universidade - Parte 1 de 7


Ao abrir meus olhos vi tudo embaçado. Minha cabeça doía demais. No ouvido aquele irritante barulhinho. Senti algo escorrendo pelo meu rosto, e ao passar a mão vi que era sangue. Imediatamente coloquei a mão no peito e percebi que estava com o sinto de segurança. Fui salvo pelo hábito. Mesmo naquela correria eu havia pensado em colocar o sinto. Olhei para o lado e vi Mateus, ainda desmaiado. Percebi que ele também havia colocado o sinto. Ao contrario de mim ele não sangrava. Uma mão pousou sobre meu ombro. Era meu irmão. Segurei a mão dele e a apertei, dando a entender que estava tudo bem. Foi então que notei uma coisa muito nítida, mas que não havia passado pela minha cabeça ainda. Já havia amanhecido. Estava totalmente nublado, chovia um pouco, mas havia amanhecido. Foi então que olhei para frente e vi uma cena horrível. A viatura havia batido de frente com uma arvore. A frente da viatura não existia mais. O para-brisa estava quebrado, estilhaçado. Esticado para fora, no capô do carro, estava o corpo de Carlos. Pobre homem. Na pressa de sair com a viatura não havia colocado o sinto. Só pensou em nos tirar dali rapidamente. Triste.

Sacudi Mateus e ele foi voltando a si aos poucos. Ele foi passando o olho na cena horrível que nos cercava. Perguntei se ele estava bem, ele respondeu que sim.

Retirei o sinto e abri a porta da viatura. Foi um pouco difícil, devido a pancada, mas consegui. Estávamos no meio da mata. A boa noticia era que estávamos sozinhos. Sem ninguém por perto. Nem os “mortos”. Abri a porta traseira e ajudei meu irmão a sair. Amanda e Sofia também saíram. André ainda estava desmaiado. Sofia então viu o corpo de seu marido e se desesperou. Começou a chorar muito e se aproximou do homem morto. Pedi para Amanda consolá-la.

– Droga! – meu irmão gritou.

Ele havia tentado acordar André e percebeu que o rapaz havia quebrado o pescoço na batida. Estava morto. Era aterrorizante. Ao longe vimos enormes nuvens de fumaça se erguendo. Vinham do quartel. O que quer que tenha acontecido lá, já havia acabado.

– Precisamos sair daqui. – falei já indo para a parte traseira da viatura, onde estavam nossas coisas.

Lá estavam diversas coisas. O porta-malas da viatura era enorme. Nele colocamos alimentos, diversos deles. Colocamos ração militar. Colocamos cobertores e algumas roupas. Quatro galões de água de vinte litros. Não foi fácil esconder esses enormes galões e levá-los escondidos até a viatura. Pegamos também três fardos de garrafas de água. Em cada fardo havia nove garrafas. E também aquele mini botijão de gás que eu havia encontrado no condomínio do Rodrigo.

Rodrigo. Ele já estava se tornando um problema para nós. Pelo jeito havia sobrevivido ao ataque naquele descampado. Algo me diz que não foi a ultima vez que eu o vi.

Ao longe vimos um prédio. Mateus o reconheceu como um dos prédios da faculdade de agronomia de Taubaté. Lá poderia ser um bom refugio provisório. Contanto que estivesse vazio. Dividimos as coisas para cada um levar. Ficamos muitos minutos tentando convencer Sofia a ir conosco. E quando estávamos prontos para partir algo aconteceu. Primeiro ouvimos um gemido e ficamos em alerta. Meu irmão largou as coisas que estavam em suas mãos e pegou sua arma. Ficamos imóveis. Mas não ouvimos mais nada. Então ouvimos algo estranho, como uma mão arranhando algo.

– Pessoal... – disse meu irmão nos apontando o local da origem do barulho.

Lá estava ele. Carlos. Seus olhos terrivelmente estranhos. O que antes eram de um azul claro, agora eram de um cinza claro, quase branco. Ao redor todo vermelho. Seus dentes haviam apodrecido de uma hora para outra. Bizarro. Enormes veias saltavam de seu pescoço. Naquele momento Sofia começou a chorar. Ela havia percebido no que ele se transformara.

– Amanda. Tire Sofia daqui. – eu pedi.

Amanda os acompanhou, deixando meu irmão, eu e Mateus ali, com o morto. Ele tentava em vão sair dali. Não tinha forças para se virar e sair do capô da viatura. Nos aproximamos dele e a vimos. Ela. A mordida que ele havia levado no ombro esquerdo. Ele não nos contou isso, causando a batida, pois havia ficado fraco.

– Precisamos fazer alguma coisa. – eu disse.
– Ou não. – meu irmão comentou. – Ele não irá sair daqui. Não vai nos seguir.

Então decidimos não fazer nada. Poderíamos matá-lo, mas seria uma idiotice usar uma arma ali. Causaria um barulho enorme, e com certeza atrairia horríveis surpresas. E não tínhamos outro tipo de arma que fizesse menos barulho. Nem um pedaço de pau sequer. Saímos dali e alcançamos os outros. Vi nos olhos de Sofia algo diferente. Não sei se era gratidão por não ter matado o já morto marido dela, ou se era tristeza em saber que o pobre coitado iria ficar vagando por ai, como um morto-vivo.

Seguimos em direção ao prédio da faculdade. Assim que nos aproximamos lentamente, vimos que estava deserto. Ele era cercado por enormes grades. No topo delas havia arame cortante em espiral. Atravessamos o amplo estacionamento e nos aproximamos da cerca. Estávamos em frente ao nosso abrigo. Só faltava uma coisa.

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Escrito 13/08/2012 ás 10h57. Taubaté-SP

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